domingo, junho 24, 2007

Editorial - "A justiça divina" de Pinto da Costa e o abraço de Carlos Magno




À boa maneira dos poderosos populistas em Portugal a contas com a Justiça (terrena), Jorge Nuno Pinto da Costa, disse, ontem, na festa do 37.º aniversário da Casa do FC Porto em Lisboa, que confia, sobretudo, na justiça divina. “Acredito nos tribunais e, sobretudo, na justiça divina” – disse o presidente do FC Porto, depois de o Ministério Público o ter acusado de novos e supostos crimes de corrupção desportiva. Ao dizer “sobretudo, justiça divina”, o líder dos Dragões estava a expressar, inequivocamente, que, afinal, não confia na Justiça deste mundo.

É sempre assim!... No início, quando são acusados, barafustam, barafustam e invocam o nome de Deus em vão, enganando-se a si próprios cientes que vão ser as massas populares – os eleitores ou, no caso, os adeptos – que os vão julgar; depois, remetem-se ao silêncio, porque chegam à conclusão que passaram o tempo todo a dizer o que não deviam e que, no fundo, as suas palavras vieram a prejudicá-los. A primeira atitude é uma tentativa de instrumentalização das massas para impressionar a Justiça (terrena); a segunda é a solidão....

Como refere um dos sete pilares da sabedoria de uma das escolas mais antigas da filosofia grega, “a maioria é perversa”, porque todo o poder é exercido por uma minoria; Eugénio de Andrade, por sua vez, chegou a dizer que o “fenómeno desportivo", quando emanado de populismo (como é o caso do futebol), é, muitas vezes, proporcionador de falta de cultura, mais medieval que moderno”.


E, por falar em cultura, um dos que ficou mal na “fotografia” na festa da Casa do FC Porto em Lisboa foi o jornalista e comentador de assuntos gerais Carlos Magno, que, três segundos após Pinto da Costa ter terminado o seu incisivo discurso, dirigiu-se a ele e foi abraçá-lo efusivamente, com certeza, em sinal de solidariedade. Refira-se, um discurso incisivo, em que Pinto da Costa faz referências à sua situação judicial e também em relação a uma colega de Carlos Magno, que é a jornalista Leonor Pinhão.


Carlos Magno tem todo o direito de ser portista e membro da área cultural do FC Porto, mas, dado ser um reputado comentador de assuntos gerais, devia abster-se de certos gestos, como o de ontem, para continuarmos a acreditar na sua autodeterminação crítica e credibilidade.

Um portista, mesmo com as responsabilidades éticas e profissionais de Magno, pode, em público ou em privado, dar um fervoroso abraço ao presidente do seu clube, por exemplo, nos festejos da vitória de um jogo, na conquista de um campeonato ou de uma Taça. Porém, portistas, benfiquistas ou sportinguistas da estirpe de Carlos Magno, em circunstâncias similares àquelas – em que se fazem referências à Justiça (terrena) e a uma colega jornalista -, não se podem prestar a esse papel. E, muito menos ainda, quando, nas referidas circunstâncias, toma a iniciativa de ser ele, Carlos Magno, a deslocar-se para o abraço comprometedor.

Por outro lado, não deixará de ser eticamente grave e condenável se as acusações de Pinto da Costa sobre alegadas viagens pagas a Leonor Pinhão forem verdadeiras, mesmo não sendo crime. Uma coisa é certa: Leonor Pinhão, jornalista desportiva, não tem o mesmo estatuto de Carlos Magno, nem o reclama, mas o caso, a ser verdade, não deixa de ser preocupante a nível ético. Falta saber em que circunstâncias essas viagens terão sido pagas.

Por fim, tenha-se em atenção que o presidente do FC Porto, ao criticar duramente a notícia do Correio da Manhã, não estava a criticar propriamente este jornal diário, mas a procuradora Maria José Morgado. É o hábito deste país de se falar para o lado!


Estas linhas foram escritas não motivadas por qualquer sentimento clubístico, mas por repulsa a todos os populismos, sejam de quem for. O FC Porto é uma grande instituição europeia, e, como tal, temos pelos seus adeptos o merecido respeito.